quinta-feira, 25 de setembro de 2008

A rádio do serviço público e a cidadania

Em Junho do corrente ano(2008), a Rádio de Cabo Verde ( sector Público) em colaboração com a Universidade Jean Piaget realizou uma mesa redonda versando o tema “O papel da rádio na era da Informação – as experiências de Cabo Verde e Moçambique.” No dizer dos organizadores, a iniciativa visava lançar algumas luzes sobre o contributo da rádio no reforço da cidadania e da participação cívica nos Estados de democracia em fase de consolidação. À propósito, preparei uma comunicação que julgo ser útil partilhar com quem se interessa por estas coisas. As ideias reflectem o meu ponto de vista. Muito pessoal.

Aproveito a ocasião para saudar o meu muito amigo Carlos Alberto dos Santos, director da Rádio de Cabo Verde naquela altura, que muito me motivou a escrever este texto e a quem o dedico. Por ser um lutador incansável pela democratização e mordernização dos media.



A Nossa Rádio

O papel da Rádio Pública na democratização do Estado

No convite que me foi formulado são-me apresentadas 3 questões às quais respondo de imediato. Porém, não é possível fazê-lo com alguma qualidade sem antes discutir o tema central da mesa redonda: O Papel da Rádio Pública na democratização do Estado. Assumindo-se aqui o conceito democratização na sua anatomia mais difundida.

Aceita-se que o Serviço Público de Rádiodifusão ( SPR), de entre várias outras tarefas , defenda e promova os vários interesses públicos do seu meio. Primordialmente, Referimo-nos aqui aos direitos e deveres constituicionais. Aos princípios universais do direito de cidadania. De igual modo, a construção de uma consciência cívica responsável e participativa é um comando capital.

A exequibilidade de um spr assim entendido requere a construção prévia, e continuada calibração, de um ambiente que se deve caracterizar por conferir um mandato devida e realisticamente formulado. E oportunamente regulado. Porém, são os factores de gestão e de organização que garantem resultados, daí que o spr deve estar devida e proporcionalmente estruturado para capitalizar todo o quadro filosófico e legal envolvente.

O que até agora temos visto são factores estruturantes e contigenciais. Porém, o cliente, o utente do spr, é o cidadão, é o ouvinte. E ele acede, essencial e tradicionalmente, ao spr através da emissão, do web site, etc. Através de uma disponibilização de conteúdos.

O conteúdo disponibilizado na rádio ou televisão é organizado sob a forma de programas. A programação, programas devidamente organizados e sequenciados, é o cerne do nosso interesse. Ela em si e a maneira como é orquestrada e continuamente alimentada definem o spr.

A programação de um spr deve, na fonte de tudo o resto, estar comprometida com os valores e aspirações da nação. Por isso ela deve ser inclusiva, sem que isso transforme a programação num caledoscópio de minoridades. Do ponto de vista estético , e isto é muito importante, o spr deve apresentar produtos de alta qualidade e competitivos. Deve ter um ar cosmopolita e fashion.

Estamos assim a advogar uma ruptura com os padrões de mediocridade que eram impostos ao spr em nome de primazia da sua função educativa, emancipadora e mobilizadora. Estamos a defender, portanto, que na sua tarefa de palanque e patrocinador de um amplo ( continuo, profundo) e responsável debate da agenda nacional, o spr deve fazê-lo de forma competitiva, assumindo que estamos de facto numa época em que é preciso fazer bons programas e gerir a programação com leveza e sentido de oportunidade. É da conjugação, aliás, de todos estes elementos que nasce a legitimização social do spr. E, por sua vez, esta legitimização encurta e viabiliza a tarefa do spr de construir e reflectir a identidade cultural e histórica das nações e comunidades.

Estas asserções serão válidas apenas na condição de os programas, achados de maneira mais ou menos individualizados, na sua morfologia, forem relevantes. Se os programas, no momento da sua transmissão e partilha pública, forem de encontro às necessidades da comunidade. A relevância mede-se também pelo dialogismo activo ou passivo. O programa deve enquadrar-se e desencadear (n)o debate. Ao mesmo tempo, impõe-se ao programa que seja significante. E como já vimos, tanto do ponto e vista de construção temática, como olhando para os aspectos da plástica, a criatividade é o elemento centripetador. E evitem-se as vulgaridades e obsenidades semânticas que se atribuem a este conceito ( criatividade).

Resumidamente, os programas devem: a) construir valores de cidadania; b) educar e formar o cidadão e c) contribuir para o desenvolvimento e progresso harmonioso da comunidade. E para que o spr seja eficaz é fundamental que o público o tenha sob confiança. A confiança legitima. E ambas são filhas da relevância. Por sua vez, ser relevante significa produzir e gerir conteúdos com seriedade, oportunidade e qualidade. O público tornar-se-á “permeável “ e participativo diante deste quadro. E se isso acontecer, o spr estará a cumprir o seu mandato.

Sem comentários: