segunda-feira, 20 de outubro de 2008

LÍNGUAS NACIONAIS: 4ª E ÚLTIMA PARTE

Termino hoje a publicação de uma comunicação que apresentei no dia 9 de Novembro na Beira do ano 2000. Num seminário de reflexão sobre a Rádio ( Moçambique) e Televisão ( de Moçambique). Como terei dito algures, muitos dos dados apresentados na comunicação devem ser referenciados ao ano em que a mesma foi redigida, mostrado-se, por conseguinte, desactualizados. Não acontecendo o mesmo com as ideias e princípios, cujo interesse, aliás, justifica, no meu ponto de vista, esta partilha pública.

Há ainda um dado que importa trazer à liça. No censo de 1997, o CiNdau aparece como a língua mais falada na província de Manica, superando o CiManyika, o CiUtee, o CiBarwe e o Português. Há 16 anos a situação era bem diferente. O que aconteceu para este crescimento do CiNdau? Fenómenos migratórios? Mudança de atitude sociolinguistica? O que quer que tenha acontecido é extraordinário. E levanta um gravíssimo problema à Rádio Moçambique: devemos ( A RM-EP) introduzir o CiNdau em Manica ( Emissor Provincial de) ou não? Aliás, deve andar a RM-EP a introduzir e a retirar língua conforme as estatísticas vão mostrando cenários diferentes? Outro aspecto curioso é este: A RM-EP, ainda em Manica, transmite a língua Cibarwe. Este CiBarwe, que às vezes muda de nome e fica CiBalke, não aparece no citado censo de 1997 e em seu lugar surge o CiSena, com um expressivo 10 % de falantes. Houve inclusão, exclusão, diferenciação linguística? Como agir? Não deveremos olhar para as Rádios comunitárias como factor de peso nesta equação?

Uma das páginas mais críticas na experiência da RM-EP nesta matéria tem a ver com os recursos humanos. Tem acontecido realizarmos ( a RM-EP) um mesmo concurso para locutores em línguas nacionais durante um ano inteiro. Isto porque quando aparece um candidato, o mesmo domina a língua portuguesa, tem a décima segunda classe, mas é fraco na língua nacional. Quando é bom na língua nacional, não tem a décima-segunda classe. Quando satisfaz estas duas exigências, tem mais de 35 anos e não quer deixar o seu anterior emprego. Quando calha ser admitido, revela que não domina a ortografia das línguas nacionais e não conhece a variante utilizada nas emissões. A tudo isto deve-se acrescentar a relação crispada entre língua/cultura e sociedade. Por mais craques que sejam os profissionais, custa-nos explicar com sucesso, nas línguas nacionais, os problemas do bug informático do milénio ou o afundamento do submarino nuclear kursk ou ainda explicar como se retira e coloca as camisas de vénus ou que o coito interrompido é uma técnica de anti-concepção.

Distintos, a prática de utilização das línguas nacionais na RM-EP é irresistivelmente bela e sedutora. Bela e sedutora como uma rosa. Uma rosa que todos devemos cuidar para que exubere mais e mais e nos envolva com a sua fragrância. Uma rosa que, mesmo assim, é coroada por espinhos que não devem ser obliterados nem por nossa auto-castração nem pela ligeireza de quem deve investigar, aconselhar e decidir. E muito obrigado.

Beira, 9 de Novembro de 2001


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